Obesidade e GLP-1

Inibição do apetite tratamento com GLP-1 (Ozempic) revoluciona combate à obesidade

O tratamento da obesidade e o consumo excessivo de açúcar, está a conhecer uma revolução com a aprovação e lançamento de uma classe de medicamentos denominada agonistas do GLP-1 ou seja, agonistas do péptido-1 semelhante ao glucagon,  que inibem o apetite de forma potentes mas relativamente segura. Neste artigo suportado pelo trabalho da Dra Aurora Simón, farmacêutica do Centro de Informação do Medicamento (CIM) da Ordem dos Farmacêuticos, são apresentadas as diversas opções farmacológicas atualmente mais utilizadas no combate à obesidade, incluindo os novos medicamentos.

A Organização Mundial da Saúde define quantitativamente o sobrepeso e a obesidade através dos valores do índice de massa corporal (IMC): peso (kg)/altura (m2).1 O sobrepeso é definido por um IMC >25 kg/m2 e a obesidade por um IMC > 30 kg/m2 [obesidade moderada (30-34,9 kg/m2), obesidade grave (35-39,9 kg/m2) e a denominada mórbida (>40 kg/m2)].1,2 As complicações de saúde derivadas do excesso de gordura corporal aumentam à medida que o IMC aumenta.3

A obesidade é um fator de risco para doenças cardiovasculares como a diabetes tipo 2, a hipertensão ou a dislipidemia.1,2,4,5 O excesso de peso aumenta o risco de litíase biliar, refluxo gastroesofágico, apneia do sono, osteoartrose,2,6 esteatose hepática,6 cataratas e atraso na cicatrização de feridas.2 A obesidade tem sido associada a um risco aumentado de cancro colorretal, da mama, endometrial, renal,2,5 do ovário e da próstata. A obesidade pode ter consequências sociais e psíquicas ligadas a estigmatização e a discriminação.2 As comorbilidades associadas à obesidade aumentam a morbimortalidade e os custos com a saúde.7

Há medicamentos que causam ou agravam a obesidade por aumentarem o apetite ou a apetência por açúcar, perturbarem o metabolismo glucídico, modificarem a distribuição da gordura ou diminuírem a atividade física. Entre os fármacos que favorecem o aumento de peso estão: hipoglicemiantes, neurolépticos (especialmente os atípicos), antidepressores, benzodiazepinas, lítio, antiepiléticos, piracetam, corticosteroides e alguns anti-histamínicos.2

Obesidade e tratamento atual

A obesidade é uma doença crónica e multifatorial que precisa de uma abordagem multidisciplinar,8 requer um tratamento de longo prazo e estratégias eficazes para a manutenção do peso.9 As mudanças no estilo de vida são a base para controlar o excesso de peso.7 Associar medidas dietéticas equilibradas à atividade física é mais eficaz para diminuir o peso.2 Será necessária uma redução da ingestão calórica a longo prazo. A atividade aeróbica (30-60 min) na maioria dos dias da semana pode levar a uma pequena redução de peso e gordura, melhoria nos parâmetros cardiometabólicos e manutenção da perda de peso.3 O objetivo do tratamento é prevenir, tratar ou reverter as complicações da obesidade e melhorar a qualidade de vida.1,4 Na maioria das pessoas, uma diminuição de 5% do peso inicial reduz o risco de complicações,2,10 diminui a pressão arterial, a colesterolemia, a incidência de diabetes e os problemas respiratórios e proporciona uma melhoria funcional na artrose do joelho. O benefício da perda de peso na redução da mortalidade em pessoas com sobrepeso ou obesidade é incerto.2

Não existem ensaios clínicos aleatorizados que o confirmem. Contudo, há alguma evidência procedente de estudos observacionais.1 Existem alguns regimes para emagrecer drásticos (pobres em gorduras, hiperproteicos, nutrição só com alguns alimentos, regimes dissociados). Nenhum destes tem maior eficácia do que uma restrição calórica moderada e equilibrada. Os regimes muito restritivos expõem a efeitos graves: carências, desnutrição, litíase biliar, hiperuricemia, hipotensão ortostática ou diminuição da densidade óssea.2

Cirurgia bariátrica

A cirurgia bariátrica é reservada para casos graves (IMC ≥40 kg/m2 ou 35 a 39,9 kg/m2 com pelo menos uma comorbilidade grave) que não atingiram as metas de perda de peso com outras intervenções.1 Algumas sociedades médicas recomendam-na, por ter mostrado maior perda de peso e duração do efeito, e melhores resultados em saúde do que a terapêutica farmacológica.11 Contudo, não é a primeira escolha para a maioria das pessoas.5 Expõe a complicações,2,10 por vezes mortais.2 Podem ser utilizados dispositivos para tratamento da obesidade se os medicamentos forem ineficazes ou não tolerados, em doentes que não podem ou não querem submeter-se à cirurgia, ou, como uma transição, antes desta.1

Tratamento farmacológico

O tratamento farmacológico da obesidade deve ser considerado apenas quando não se consegue a perda de peso desejável com mudanças no estilo de vida.3,12 Pode ser útil em pessoas incapazes de realizar modificações comportamentais por dificuldades relacionadas com doenças crónicas.6 Ao longo do tempo, diversos fármacos antiobesidade mostraram problemas de segurança.4 Os primeiros utilizados foram os simpaticomiméticos (ex.,fentermina) e serotoninérgicos (fenfluramina), tendo sido retirados do mercado na Europa pelo risco de eventos cardíacos, entre outros.5 Outros fármacos com ação no sistema nervoso central foram retirados por transtornos psiquiátricos e risco aumentado de suicídio (rimonabant) e de eventos cardiovasculares graves (sibutramina).4,5,10,13 As opções para o tratamento da obesidade atualmente autorizadas em Portugal incluem:

  • Orlistato;
  • Liraglutido;
  • Bupropiom e naltrexona em associação.

Os medicamentos devem ser usados em conjunto com uma alimentação saudável, atividade física e modificação comportamental. A decisão de iniciar a terapêutica deve ser individualizada.6 As pessoas em tratamento devem estar motivadas e participar no controle da sua doença.8

Orlistato

O orlistato é um inibidor reversível das lipases gástricas e pancreáticas, que altera a digestão gastrointestinal da gordura.8 Esta não é hidrolisada por completo, aumentando a sua excreção fecal.6 Administrado três vezes ao dia, durante ou até 1 hora após as refeições, o orlistato reduz em cerca de 30 % a absorção da gordura ingerida.4,11 O orlistato é indicado no tratamento da obesidade ou em pessoas com sobrepeso (IMC ≥ 28 kg/m2) com fatores de risco associados, em conjunto com uma dieta hipocalórica moderada.5 Foi comercializado inicialmente na forma de cápsulas de 120mg (sob prescrição médica) e, posteriormente, foi aprovada uma apresentação com 60 mg como medicamento não sujeito a receita médica.5,8 A eficácia do orlistato foi mostrada em diversos ensaios clínicos e meta-análises.4,5 Facilita uma diminuição de peso moderada.10

No amplo estudo XENDOS (Xenical in the prevention of diabetes in obese subjects), o orlistato resultou em perda de peso significativamente superior ao placebo (-10,6 kg vs. -6,2 kg em 1 ano e -5,8 kg vs. -3,0 kg após 4 anos, respetivamente), além de uma redução nos fatores de risco cardiovascular.13 O orlistato também reduziu significativamente a incidência de diabetes tipo 2 em comparação com o placebo (6,2% vs. 9,0%), ao longo de 4 anos,6,12 o que corresponde a uma redução do risco de ≈37%.7-9 Uma meta-análise de 12 estudos realizados com orlistato e intervenção dietético-comportamental mostrou perdas de 8% do peso inicial em 12 meses,6 mantendo a perda depois de 3 anos de tratamento,5,8 com uma diferença média relativamente ao grupo controlo de 3 kg.5,6 O orlistato pode afetar positivamente as comorbilidades relacionadas com o excesso de peso.7 Em indivíduos com obesidade e intolerância à glicose o orlistato mostrou redução na progressão para diabetes tipo 2;11,14 em pessoas com diabetes tipo 2 diminuiu os níveis de hemoglobina glicosilada (HbA1c) e de glicemia em jejum;4,11,15 adicionalmente, mostrou redução na pressão arterial.6,9,11,12 O orlistato melhora também alguns valores de lípidos séricos,4,6,12-14 em maior grau do que pode ser explicado apenas pela redução de peso.6 Contudo, ainda são necessários outros estudos sobre os resultados cardiovasculares.9

O orlistato causa com frequência efeitos gastrointestinais, que incluem flatulência, cólicas, incontinência fecal, urgência intestinal, e esteatorreia.5,6,8,11 São o principal motivo para a interrupção do tratamento16 e ocorrem principalmente após a ingestão de um alto teor de gordura. Para evitá-los, recomenda-se que a ingestão diária de gorduras não ultrapasse 30% das calorias.6,11,14 Foram relatadas raramente lesões hepáticas graves com o uso de orlistato, mas não foi estabelecida uma relação causal.6 Raramente, foi relacionado com colelitíase e pancreatite.14 O orlistato causa um aumento na absorção intestinal de oxalato,6,14 o que pode contribuir para o desenvolvimento de cálculos renais,14,16 e de lesão renal aguda.6,11,14 A função renal deve ser vigiada periodicamente,11 e não se recomenda a utilização em indivíduos com história de cálculos de oxalato de cálcio.6,7

O orlistato está contraindicado em caso de má absorção digestiva, colestase,7,11,12 e durante a gravidez11,12,14 e o aleitamento.4,6,7 O orlistato pode diminuir a absorção de vitaminas lipossolúveis,2,5,7,9,12,14 podendo ser aconselhado um suplemento multivitamínico,6,9,11,12 tomado pelo menos 2 horas antes ou após a administração do orlistato,5 ou ao deitar.6 Também pode diminuir a absorção de ciclosporina, amiodarona,5,7,14 alguns antiepilépticos,2,5,7 levotiroxina,2,7 e de antirretrovirais para o tratamento do VIH.14 Uma diminuição na absorção da vitamina K pode tornar necessária uma redução da dose de varfarina.6,14

Liraglutido e GLP-1

O agonista do péptido-1 semelhante ao glucagon (GLP-1), uma incretina, estimula a secreção de insulina pelas células beta pancreáticas e inibe a libertação de glucagon de uma forma dependente da glicose. Também retarda o esvaziamento gástrico, aumenta a saciedade pós-prandial e reduz a ingestão de alimentos.4,11,12

O liraglutido, com nome comercial Victoza, é um análogo do GLP-1 utilizado habitualmente no tratamento da diabetes tipo 2 (1,2-1,8 mg/dia).7 Mais recentemente, foi autorizada uma nova apresentação, indicada, como complemento de uma dieta hipocalórica e aumento da atividade física,5 para o controlo de peso em adultos com IMC ≥30 kg/m2 ou entre 27-30 kg/m2 na presença de pelo menos uma comorbilidade relacionada com o peso, como alterações na glicemia, hipertensão, dislipidemia ou apneia obstrutiva do sono.6

A dose inicial recomendada de liraglutido é de 0,6mg/dia (administração subcutânea), seguida de escalonamento semanal da dose em incrementos de 0,6 mg até atingir a dose diária máxima de 3 mg.5,6,11,16 A titulação pode ser mais lenta se o liraglutido for mal tolerado (por ex., náuseas, vómitos). A dose máxima tolerada (se inferior a 3 mg) pode ser continuada, se for eficaz na perda de peso.6,16 Os dados que demonstram uma perda de peso sustentada (> 3 anos) são escassos. O liraglutido foi associado a uma redução significativa do peso em pessoas com diabetes, relatada também em não diabéticos.6

A eficácia do liraglutido na obesidade foi estudada em 4 ensaios clínicos em indivíduos com sobrepeso e obesos – SCALE (Satiety and Clinical Adiposity, Liraglutide Evidence),8,13 que compararam o uso do liraglutido associado a alterações comportamentais, em indivíduos com e sem comorbilidades associadas, com placebo, mostrando perda de peso significativamente maior no grupo de liraglutido, com uma proporção maior de participantes perdendo > 5% de seu peso corporal.8,9 Num dos estudos, a incidência de novos casos de pré-diabetes (7,2% vs. 20,7%) e diabetes (0,2% vs. 1,1%) foi significativamente menor nos tratados com liraglutido. O estudo realizado em doentes obesos com apneia obstrutiva do sono mostrou melhorias significativas na gravidade da apneia.8,11,15

Além da perda de peso, o liraglutido mostrou efeitos favoráveis nos resultados cardiovasculares em indivíduos obesos com diabetes tipo 2.12 Em alguns estudos houve melhora no controle glicémico e no perfil lipídico e redução da pressão arterial.9,12,15 São necessários estudos adicionais para definir resultados a longo prazo numa população grande e diversa, incluindo os efeitos na morbilidade e mortalidade cardiovascular.15 Os resultados cardiovasculares não foram estudados em pessoas obesas sem diabetes.6

O estudo LEADER (Liraglutide Effect and Action in Diabetes: Evaluation of Cardiovascular Outcome Results) em doentes com diabetes e alto risco cardiovascular mostrou uma redução na mortalidade por causas cardiovasculares e menor taxa de enfarte do miocárdio e acidente vascular cerebral não fatais comparativamente com o grupo controlo.9,13 Os efeitos adversos mais frequentes do liraglutido são gastrointestinais (náuseas, diarreia, vómitos, obstipação, dispepsia).4,6,11,15,16 São efeitos ligeiros a moderados, transitórios,7,8,15 atenuados com o aumento gradual da dose.16 Foram relatadas hipoglicemia, cefaleia, aumento da frequência cardíaca,5,15 maior incidência de litiase biliar,5,11,16 tonturas, insónia, astenia,4 e pancreatite.5,6,13,16 O risco desta última não parece aumentar significativamente,9,11 mas faltam dados de longo prazo.9 O liraglutido não deve ser usado em pessoas com insuficiência renal ou hepática grave,7,16 história de pancreatite,8,16 gravidez, e em pessoas com história pessoal ou familiar de cancro medular da tiroide ou neoplasia endócrina múltipla tipo 2.6,7,11 Deve existir precaução em história de colelitíase, gastroparesia,7,8 ou doença inflamatória intestinal.7 Devido ao risco de hipoglicemia, quando tomado com insulina ou com uma sulfonilureia é necessária a monitorização da glicemia, podendo ser precisa uma redução da dose.6 Não é recomendado no aleitamento.7,15

Bupropiom e Naltrexona

A associação de bupropiom e naltrexona (BN) está disponível em comprimidos de libertação prolongada com 90/8 mg.11 O bupropiom é um inibidor seletivo da recaptação da dopamina e da noradrenalina,8,11 usado no tratamento da depressão e na cessação tabágica.6,13 A naltrexona é um antagonista de recetores opioides usado no tratamento da dependência de álcool e opioides. Embora o mecanismo de ação não seja claro, postula-se que ambos os fármacos têm um efeito sinérgico nos centros da fome localizados no hipotálamo.8,13 A ação inibitória sobre o apetite do bupropiom é transitória, devido a um mecanismo de autorregulação mediado por endorfina. Esta seria bloqueada pela naltrexona, mantendo a ação anorexígena por longo tempo.7 A associação BN está indicada como adjuvante de uma dieta hipocalórica e de aumento da atividade física para controle de peso em adultos com IMC ≥30 kg/m2 (obesidade) ou IMC entre 27-30 kg/m2, na presença de pelo menos uma comorbilidade relacionada com o peso.5,6

A dose inicial, um comprimido/dia, é aumentada em um comprimido/semana ao longo de quatro semanas, até uma dose máxima de dois comprimidos de manhã e dois comprimidos à tarde.2,5,6,8 Este aumento lento da dose minimizará as náuseas, um efeito colateral comum.12

Em vários estudos clínicos, BN mostrou eficácia na redução do peso, dependente da dose.9 A evidência de eficácia clínica é baseada em 4 estudos (Contrave Obesity Research: COR-1, COR-II, COR-BMOD e COR-diabetes) realizados em indivíduos com sobrepeso e obesidade com comorbilidades associadas. Comparada com placebo, a associação mostrou redução de peso de cerca de 4 a 5%.5,6,11,12,16 A percentagem de perda de peso observada nos dois primeiros ensaios COR com BN (360/32 mg) em comparação ao placebo foi de 6,1% vs. 1,3% e 6,4% vs. 1,2% respetivamente.12 É alcançada uma maior perda de peso (9,3% vs. 5,1%) quando se combina com um programa com modificações alimentares e comportamentais. 7,8,12 No ensaio realizado em pessoas com diabetes tipo 2, a perda de peso foi de 5,0% vs. 1,8% com o placebo,12 aumentando também o número de pessoas com uma perda ≥5 % (44,5 % vs. 19 %).4 Além disso, houve redução da HbA1c em relação ao valor basal. Os ensaios revelaram melhorias no colesterol-HDL e nos triglicerídeos nos tratados com BN.4,10-12 A eficácia a longo prazo é desconhecida.13

Têm sido relatados efeitos adversos como náusea (muito frequente), cefaleias, tontura, vómito, boca seca, obstipação,5,6,11,12 e insónia,6,8 que tendem a diminuir após várias semanas de tratamento.7 Foram detetados casos de aumento da frequência cardíaca e da pressão arterial.5,6,10,12 É recomendado medir a pressão arterial antes de iniciar o tratamento com BN e depois periodicamente.6 Um ensaio de segurança realizado em doentes com sobrepeso ou obesos com risco cardiovascular aumentado (LIGHT) foi finalizado precocemente, devido à divulgação pública de dados preliminares favoráveis ao fármaco, quando só tinha sido realizado 25% do estudo.6,7 A segurança cardiovascular permanece desconhecida, exigindo investigação mais aprofundada,6,11 que avalie resultados cardiovasculares e na condução cardíaca.6

As contraindicações incluem gravidez, hipertensão não controlada, transtorno alimentar,6-8,11 convulsões e uso de inibidores da monoamina oxidase ou sua interrupção nos 14 dias anteriores.6,11 Também não deve ser usado em mulheres a amamentar, em depressão grave,8 e naqueles que estão numa fase de abstinência abrupta do álcool ou em tratamento com opioides.5,7,8 Em doentes com insuficiência renal ou hepática é recomendado o ajuste da dose ou a não utilização, dependendo da gravidade.6 Atenção especial deve ser dada à presença de arritmia cardíaca, glaucoma de ângulo estreito, enxaquecas persistentes, ataques de ansiedade generalizada, e doenças hepáticas ou renais.8 A associação BN pode interagir com outros medicamentos metabolizados pelo CYP2D6 como, por exemplo, metoprolol, propafenona, flecainida, ticlopidina, clopidogrel, venlafaxina, antidepressores tricíclicos, carbamazepina, fenitoína, antirretrovirais, ciclofosfamida ou tamoxifeno.7 Deve existir vigilância da depressão ou pensamentos suicidas.6 A falta de dados de segurança cardiovascular a longo prazo limita o seu uso em doentes com risco cardiovascular aumentado.4,9,12

Qual dos medicamentos é a melhor escolha?

Os fármacos mostram eficácia na redução de peso. Contudo, muitos ensaios têm importantes limitações e existem poucos ensaios comparativos.6 A eficácia dos medicamentos costuma ser limitada a uma redução de 5 a 10% no peso corporal num ano.4,9,10 A perda de peso varia de acordo com as mudanças no estilo de vida efetuadas.4 O liraglutido pode ser usado em pessoas com e sem diabetes, mas é preferido nas pessoas com diabetes tipo 2 6,9,15 e, particularmente, naqueles com doença cardiovascular.6 Parece seguro a nível cardiovascular, embora a maioria dos estudos tenha analisado o uso de uma dose menor.16 Devido a estes aspetos de segurança, ao baixo potencial de interferência com outros fármacos e aos possíveis benefícios no controlo glicémico, além de uma maior redução ponderal,8,15 é considerado por alguns como fármaco de primeira linha.1,6,8 No entanto, os efeitos colaterais gastrointestinais, a necessidade de uma injeção diária e os custos da terapêutica podem limitar uma utilização mais ampla.6,15

O uso do orlistato está bem estabelecido e apresenta um perfil de segurança aceitável,10 embora os efeitos colaterais gastrointestinais possam limitar o seu uso.1,6,10 Melhora vários fatores de risco cardiovascular e o tratamento a longo prazo diminui a incidência de diabetes,10 podendo ser adequado em indivíduos sem problemas intestinais que não desejem um medicamento com possíveis efeitos centrais.8

Embora a associação Bupropiom e Naltrexona possa ser útil em alguns casos,9 devido à incerteza sobre os seus efeitos cardiovasculares, alguns especialistas preferem usar outros fármacos.6 Este aspeto limita o uso em pessoas com risco cardiovascular aumentado.9 Podem beneficiar do seu uso doentes com alguma impulsividade alimentar.8

As características e comorbilidades individuais devem ser consideradas na escolha do tratamento,10 e também os possíveis efeitos adversos e as preferências do doente.6

No tratamento de comorbilidades específicas em pessoas com obesidade devem-se escolher medicamentos não associados a aumento de peso.3,6 A seleção de um antidiabético deverá ter em atenção os efeitos no peso. Por exemplo, a insulina, as sulfonilureias, as meglitinidas e as tiazolidinedionas promovem o aumento de peso.10 É necessário avaliar se é possível substituir esses fármacos por outros com efeito neutro, ou que possam facilitar a perda de peso.4 Por exemplo, embora a metformina não produza perda de peso suficiente (5%) para ser considerada como “fármaco antiobesidade” é uma boa escolha para indivíduos com sobrepeso e alto risco de diabetes.6 Por este motivo, em monoterapia, é de escolha em diabéticos com obesidade.

Também os inibidores do cotransportador de sódio e glucose 2 e os agonistas do GLP-1 promovem perda de peso.9,10 O efeito de redução de peso não é a principal indicação destes fármacos, mas pode ser desejável. Outros exemplos de fármacos que têm a perda de peso como um efeito colateral incluem: o topiramato, que pode ser uma boa opção de tratamento para pessoas obesas com enxaqueca; o roflumilaste (na doença pulmonar obstrutiva crónica), o bupropiom e a fluoxetina (entre os antidepressores).9

Após o início da terapia farmacológica, há que monitorizar a perda de peso, a pressão arterial e a frequência cardíaca.6 As agências de saúde recomendam um controlo estrito da segurança cardiovascular dos medicamentos em desenvolvimento, a realização de planos de gestão de risco e a suspensão do tratamento se o doente não tiver perdido pelo menos 5% do peso corporal basal,4,8,13 após um determinado intervalo de tempo.4 A perda de peso pode causar hipoglicemia em pessoas em tratamento para a diabetes. A automonitorização da glicemia deve ser realizada com maior frequência, especialmente nos tratados com insulina ou secretagogos de insulina (como sulfonilureias ou meglitinidas). Nestes casos deve ser realizada pelo menos diariamente durante o início e a titulação da dose dos medicamentos para perda de peso. Em diabetes bem controlada, pode ser aconselhável reduzir a dose desse tipo de antidiabéticos durante as primeiras quatro semanas de tratamento antiobesidade, ajustando conforme necessário com base nos valores de glicemia.6

Semaglutido e outros medicamentos em investigação

Encontram-se em investigação diversos fármacos para tratamento da obesidade, mas nenhum parece ser ainda o ideal. Entre eles:

  • Cetilistato, inibidor das lípases que poderia ter uma melhor tolerância do que o orlistato;10
  • Tesofensine, inibidor do transportador de noradrenalina, dopamina e serotonina;10,11,13
  • Dapagliflozina, desenvolvida para a diabetes;10
  • Zonisamida-bupropiom;13
  • Setmelanotide.11

Semaglutido

O semaglutido, com nome comercial Ozempic, outro agonista do recetor de GLP-1,7,10,11 parece proporcionar uma perda de peso superior ao liraglutido em administração oral ou injeção subcutânea semanal, mas a eficácia ainda tem de ser confirmada.10 Também se estudam associações, que possam agir em diferentes centros de controle do apetite e da saciedade, e novos mecanismos, que possam contribuir para melhorar as comorbilidades associadas à obesidade, sem aumento do risco cardiovascular ou renal.7

Neurotransmissores e hormonas

Vários neurotransmissores e hormonas envolvidos na regulação do equilíbrio entre a ingestão e o gasto calórico poderiam, teoricamente, representar possíveis alvos de tratamento como por exemplo:

  • Leptina, uma proteína sintetizada nos adipócitos, que regula a adiposidade e modula a conduta na ingesta,
  • Peptídeo YY (PYY), uma hormona intestinal que suprime o apetite e diminui a ingesta calórica.4

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